Mozart Schmitt de Queiroz
Secretário Geral do Sindipetro-RJ e dirigente da FUP
Artigo apresentado no II Forum Ambiental Pro-Rio, em 2001
Análises de catástrofes mostram que elas poderiam ter sido evitadas
Por trás dos erros fica claramente a impressão que os empresários dessa indústria – ainda que estatais – trabalham de olho grande nos lucros e muito pouco investem em prevenir os riscos inerentes a esta atividade e que são sobejamente conhecidos.
Espanta a obviedade das soluções que evitariam grandes acidentes nesta indústria. E não foram evitados por que? A pressa em produzir, a busca de recordes de produção a qualquer custo e o olhar direcionado para os enormes lucros. Além disso a progressiva redução de pessoal que deveriam cuidar dessa prevenção, agrava os problemas já existentes.
A empresa vem desconsiderando os alertas técnicos apontados nesta direção.
1. A terceirização e a precarização no trabalho em uma indústria de ponta
A política de terceirização levada a cabo pela Petrobrás, levou a uma precarização da relação de trabalho, a uma redução do nível de qualificação e de treinamento da mão de obra contratada e a um aumento dos acidentes de trabalho.
Grande parte dos acidentes com perda de tempo e mesmo acidentes fatais, vem ocorrendo nas instalações da Petrobrás com trabalhadores terceirizados. Os números da própria empresa demonstram claramente este fato. Além disso, existe uma relação de trabalho desigual e injusta quando comparados aos efetivos próprios da empresa, em relação aos direitos sociais, estes trabalhadores não recebem orientação, treinamento e material de proteção adequado às suas funções.
A terceirização virou um grande balcão de negócios, sem limites contratuais nítidos em relação às obrigações que devem ter estas empresas prestadoras para com os contratados. O descumprimento da legislação é fragrante, das Normas Regulamentadoras no que tange a proteção, exames de saúde e instalação de CIPAS ao não recolhimento de FGTS e contribuições previdenciárias.
A empresa ao adotar esta política de não realizar concursos para suprir seus efetivos de pessoa, apostou errado que reduziria custos com a terceirização, no entanto jurisprudência existe sobre a responsabilidade solidária quando de acidentes com perdas materiais ou de vida de trabalhadores contratados no interior de suas instalações e a Petrobrás tem sido obrigada a desembolsar por conta disso.
2. A legislação não é respeitada
A organização do Estado é responsável pela aplicação da legislação que cada país tem. E esta legislação, na área de higiene e segurança industrial é fruto de grandes discussões e acordos internacionais, da qual o Brasil é signatário, como as convenções da Organização Internacional do Trabalho. Assim, seria de se esperar que os organismos de Estado fossem os primeiros a respeitar essa legislação e dar o exemplo de seu cumprimento à risca.
Não é isso o que ocorre com a indústria do Petróleo no Brasil, a despeito de ser essencialmente estatal. Plataformas de petróleo foram instaladas na Bacia de Campos e postas em operação sem que tenham havido as audiências públicas precedendo a concessão das Licenças de Operação, conforme previsto na Legislação. A Petrobrás descarta muitos efluentes sem o necessário enquadramento nos limites estabelecidos em resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente - Conama.
Assim, a impressão que fica é que, por conta dos impostos, royalties , empregos, etc que uma unidade da Petrobrás pode gerar para a localidade em que se instala e para o país, tacitamente os demais órgãos públicos não cobram dela o cumprimento da legislação na execução de seus projetos. E como a Petrobras não é cobrada, os seus gerentes pouco investem no sentido de fazer cumprir o que estabelece essa legislação.
Infelizmente, esta seqüência de falhas e omissões acabaria por levar a um grande acidente e tragédia ambiental nos últimos dois anos, agredindo o ecossistema de um dos principais pontos turísticos do planeta e a fonte de renda de milhares de famílias na Baia da Guanabara. Só a partir daí, do que a empresa chamou de fatalidade, é que a Petrobrás passou a anunciar um plano que, aparentemente, significa uma radical mudança de posição gerencial em relação a segurança no trabalho e ao meio ambiente.
Foi esse mesmo grande acidente que explicitou a conivência dos órgãos ambientais para com a agressão ao meio ambiente. No calor do debate, com a imprensa publicando tudo, multas foram aplicadas, reuniões com empresas poluidoras promovidas por órgãos ambientais, foram realizadas. Aparentemente as licenças de operação e a mudança de conduta passaram a ser cobradas.
Mas tudo isso demonstrou uma vez mais, que até então esses órgãos pareciam desconhecer que havia risco na indústria do Petróleo e que muitas unidades operavam sem licença ambiental. Explicitou também que até então esses órgãos pouco estavam cobrando em termos de atuação preventiva e de cumprimento da lei de outras indústrias agressivas situadas no entorno da Baia da Guanabara.
Lei e tecnologia apropriada existem e devem ser respeitadas
A indústria do petróleo sempre enfrentou, com sucesso, inúmeros desafios tecnológicos. E a Petrobrás, por exemplo, já conquistou dois prêmios internacionais pela liderança mundial da tecnologia de produção de petróleo em águas profundas. E os méritos destas conquistas cabem aos técnicos de seu Centro de Pesquisas e de seu Serviço de Engenharia e, também, tem que ser dito, ao corpo gerencial que desde a fundação da Petrobrás entendeu que uma empresa como esta precisaria de fortes investimentos financeiros e humanos no desenvolvimento tecnológico.
Por outro lado, inúmeros estudiosos do direito ambiental são categóricos ao afirmar que o Brasil possui uma das mais rigorosas legislações ambientais do mundo. Apesar dos vetos presidenciais, a Lei dos Crimes Ambientais e a Lei das Águas se constituem em modernos e eficientes instrumentos jurídicos para coibir a agressão ao meio ambiente. Existem, ainda, desde a década de 80, várias resoluções do Conama que, se aplicadas, evitariam inúmeras agressões ao meio ambiente que são praticadas com regularidade pela indústria do Petróleo. E o mérito desta legislação deve-se a atuação de organizações sociais e ambientalistas junto ao legislativo, mas também a todo o Poder Legislativo que já compreendeu a importância de se preservar o Meio Ambiente.
Se há capacidade tecnológica para resolver problemas e se há uma legislação no Brasil que permite coibir a agressão ao meio ambiente, só há uma explicação para a continuidade das agressões ambientais, praticada por este (bem como outros) ramos industriais no Brasil: o respeito e a preservação do meio ambiente, na realidade, ainda não são elementos decisivos na política de desenvolvimento das atividades econômicas no Brasil.
(continua)